
A felicidade não dura muito tempo. Talvez uma manhã, uma tarde, uma
noite, dois dias. É mais intensidade do que duração. Se você não tira o
riso do rosto, é plástica ou está fingindo. Esconde a melancolia e se
esforça para disfarçar. Felicidade não é obsessão. Felicidade é se
contentar com o que não deu certo também. É a impossibilidade da
frustração, é o antônimo da culpa. Uma criança entende mais de
felicidade porque não a entende. O adulto, ao desejar ser feliz, já
perde metade da felicidade (e a saudade rouba a segunda metade).
Felicidade é estar sensível, disponível, atento a qualquer distração; é
uma predisposição a mudar de planos. É uma vida que não depende de um
objetivo para ser plena. É combinar um cinema, declinar e ficar
satisfeito por estar com a mulher no sofá. É desistir de uma festa e se
orgulhar de um jantar caseiro. É marcar o alarme e dormir de conchinha
mais vinte minutos. Felicidade é preguiça. Não tem a ver com trabalho. É
se divertir, de forma inédita, com o que já realizou centenas de vezes.
É se contentar com pouco, quase nada, é querer somente o que já se tem.
É absolutamente sem motivo, sem planejamento. A felicidade é a falta do
que fazer bem feita. Não é pensar naquilo que não conseguimos, é
agradecer o que redescobrimos. É quando sua alma está com o Bluetooth
ativo para outras almas e é capaz de receber amizades sem mediação. Eu
até diria que a felicidade é uma liberdade a dois. Não se revela na
emanação larga dos lábios e na sanfona dos dentes. Quando o riso é
redondo, perfeito, completo é um riso falso, riso para enganar, riso de
proteção, riso para afastar intimidade. O autêntico riso é imperfeito,
infantil, retangular, carente, envergonhado. Pede o complemento de um
abraço ou de um beijo. Aliás, a gente ri mais com olhos do que com a
boca. Já a gente chora mais com a boca do que com os olhos. Quem é feliz
tem um brilho macio nas pupilas. Há uma luminosidade no olhar que chama
portas e janelas. Quem é triste não cansa de rir e procura piada em
tudo. Não se pode ser feliz sempre, eis o que absorvi em meus quarenta
anos.
Fabrício Carpinejar