Apesar de você carregar um nome épico nas costas, você não faz jus a
ele, João. O seu nome é lindo, assim como os seus lábios finos e a sua
nuca branquinha. O seu mal é o que você é por dentro. Se não fosse esse
teu jeito todo errado e desleixado, eu olharia pra sua cara e diria que
você é um anjo. A verdade é que você é o demônio em pessoa, João. Nada
nunca é bom o suficiente pra você. Ninguém nunca é digno do seu amor.
Porque será que você infla o seu ego tanto assim, João? Você não é
diferente dos outros. A sua rotina não é agitada todos os dias da
semana. O seu tipo físico não é de nenhum deus-grego-dos-céus. Você
arqueia essa sua sobrancelha com pelos falhos e cruza os braços fazendo
essa pose de durão, mas de durão você não tem nada. Admite que vez ou
outra a sua vontade era de trocar a cerveja com os amigos por um milk
shake com alguém especial, vai. Admite que além da bunda e dos peitos,
você também repara no sorriso e nos pés. Pode parecer meio absurdo, mas
eu sei que você é encantando por pés. E sei também que a sua bebida
preferida nunca foi Whisky, mas sim Guaraná. Os seus
coleguinhas-babacas-de-balada não sabem disso, mas eu sei. Deve ser
assustador pra você ter alguém que te conhece tanto quanto eu. Tudo bem,
eu entendo a sua raiva e a sua ironia desafiadora. O que eu não entendo
é porque você continua fumando cigarro, mesmo odiando a fumaça que
gruda na sua pele. Eu não entendo porque você sente a necessidade de
beijar oito bocas diferentes a cada cinco minutos pra se sentir melhor. E
também não entendo a graça que você vê naqueles programas estúpidos de
automóveis. Eu não te entendo, João, mas juro que me esforço ao máximo
pra te aceitar. Você carrega um fardo de defeitos insuportáveis e uma
lábia com gírias indecifráveis, mas o desgraçado do seu perfume tem um
aroma bom. O seu ar superior e a sua confiança em si mesmo me dá
náuseas, mas a droga dos seus braços tem a facilidade de me passar uma
segurança que eu não sou capaz de encontrar em nenhum outro lugar do
planeta. Talvez o que eu venha a dizer agora te deixe intrigado, porque
no fundo você sabe que é verdade: você não passa de um fraco, João. Por
mais que os seus músculos saltem do seu corpo e você consiga levantar
três elefantes seguidos, você ainda continua sendo um fraco. Estúpido.
Babaca. Covarde. E mais outros milhões de adjetivos chulos. Porque você
pode fazer mil mulheres caírem de amores aos seus pés, mas tem medo de
se prender à apenas uma. Se te perguntarem o significado da palavra
“curtição”, certamente você saberá responder. Mas e o amor, João? O que é
amor pra você? Acho que agora eu te encurralei em um beco sem saída.
Por detrás de toda essa sua estrutura de homem-inabalável, existe um
menino que tem medo de amar. Eu sei disso também. O problema é que o seu
orgulho te consome da cabeça aos pés e você não é capaz de dar o braço a
torcer. A sua aparente falta de sensibilidade me irrita. Ninguém
suporta conviver no mesmo ambiente que o seu por três dias, mas olhe só
pra mim! Eu estou do seu lado a quase três anos. E você não dá valor a
isso. Aliás, você não dá valor a nada, João. Isso também me irrita. Você
não permite que ninguém descubra o que se esconde além dessa nuvem
cinzenta que te cerca, porque no fundo você tem medo da solidão. Você
tem medo de se entregar em um jogo no qual não é você quem dá as cartas,
tampouco é o dono da partida. Você tem medo de que alguém goste de você
apesar de todos os pesares. E eu gosto. Eu gosto da sua tatuagem tribal
ridícula no ante-braço, da sua barba mal feita e da unha encravada do
seu dedão do pé. Você não merece, eu sei, mas isso não é motivo o
suficiente pra me fazer desgostar. Mesmo que você xingue a sua mãe, seja
mal educado com o seu vizinho e se sinta bem em ser um completo
filho-da-puta, ainda assim eu gosto de você. Na medida do impossível,
tudo o que eu mais queria era atravessar pro seu lado do precipício e
fazer com que a gente desse certo.
O problema é que eu não sei ser a sua Maria, João.
E o meu nome ainda é Bárbara.