terça-feira, 18 de junho de 2013

 

E na minha noite sinto o mal que me domina. O que se chama de bela paisagem não me causa senão cansaço. Gosto é das paisagens de terra esturricada e seca, com árvores contorcidas e montanhas feitas de rocha e com a luz alvar suspensa. Ali, sim, é que a beleza recôndita está. Sei que também não gostas de arte. Nasci dura, heroica, solitária e em pé. E encontrei meu contraponto na paisagem sem pitoresco e sem beleza. A feiura é meu estandarte de guerra. Eu amo o feio com um amor de igual para igual. E desafio a morte. Eu - eu sou a minha própria morte. E ninguém vai mais longe. O que há de bárbaro em mim procura o bárbaro cruel fora de mim. Vejo em claros e escuros os rostos das pessoas que vacilam às chamas da fogueira. Sou uma árvore que arde com duro prazer. Só uma doçura me possui: a conveniência com o mundo. Eu amo a minha cruz, a que doloridamente carrego. É o mínimo que posso fazer de minha vida: aceitar comiseravelmente o sacrifício da noite. Clarice Lispector

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