Ciúme não é ex. Saudade não é ex, tampouco amor. Mas a vida da qual abrimos mão por um
sonho (ou por um erro) é passado. E de escolhas e de perdas é feita a
nossa história. Não há nada que se possa fazer a não ser carregar por um
tempo um peso sufocante de impotência: eu escolhi que aquele fosse o
último abraço. Agora é outra que se perde em ombros tão largos, tomara
que ela não se perca tanto ao ponto de um dia não enxergar o quanto
aquele abraço é o lado bom da vida. Da vida que te desemprega mesmo
depois de tantas noites em claro e de tantos beirutes indigestos. Da
vida que te abre uma porta que você jura ser a certa mas quando resolve
entrar descobre duas crianças brincando na sala e uma mulher esperando
no quarto. Da vida que te confunde tanto que você quer se afastar de
tudo para entendê-la de fora. Da vida que te humilha tanto que você quer
se ajoelhar numa igreja. Da vida que te emociona tanto que você não
quer pensar. Da vida que te engana. Aquele abraço era o lado bom da
vida, mas para valorizá-lo eu precisava viver. E que irônico: pra viver
eu precisava perdê- lo. Se fosse uma comédia-romântica-americana, a
gente se encontraria daqui a um tempo e eu diria a ele, que mesmo depois
de ter conhecido homens que não gritavam quando eu acendia a luz do
quarto, não amavam os amigos acima de, não espirravam de uma maneira a
deixar um fio de meleca pendurado no nariz, não usavam cueca rosa, não
cantavam tão mal e tampouco cismavam de imitar o Led Zeppelin, não
tinham a mania de aumentar o rádio quando eu estava falando, não ligavam
se eu confundisse italiano com espanhol e argentino, nomes de capitais,
movimentos artísticos, datas de revoluções e nomes de queijo, era ele
que eu amava, era ele que eu queria. Tati Bernardi.
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