Você não estava nos meus planos quando apareceu, e eu já tinha
problemas demais para me preocupar. Mal conseguia manter as pessoas que
tinha, como poderia manter mais uma? Como poderia manter você? Era
loucura. Mas mesmo assim, você foi se aproximando, com esse teu jeito
estranho, brincalhona e boba. E você sabe que não é normal. Você sabe
que tem um jeito só seu de ser. Você mesma dizia isso. Cansei de ouvir
as suas piadas idiotas no telefone e o quanto o cara da novela era
bonito, ou, quando o carinha bonitinho ficava com a vilã da história e
você gritava atrocidades no telefone, como “Seu idiota, ela é uma vaca e você vai ficar com ela? Qual o seu problema?”.
E eu apenas dava risada, apenas me divertia com a sua revolta. Acho que
era por isso que eu gostava de te ligar, mesmo nunca tendo gostado de
novela. Porque você sempre foi quem mais me fez sorrir, sempre foi quem
mais dizia besteira e ouvia as minhas idiotices. A gente era tão
diferente um do outro e ao mesmo tempo, nos dávamos tão bem. Era
engraçado ver, a forma como tudo era natural com a gente. As conversas,
ironias, bobeiras, brincadeiras. Era natural, nada forçado. Eu nunca
precisei tentar ser um pouco mais sério ou mais confiante perto de você.
E você nunca precisou ser a garota certinha ou com bons modos perto de
mim. E isso era bom, isso era ótimo. Você nunca soube lidar com os
sentimentos e eu nunca soube lidar com a minha insegurança. Mesmo você
tendo muitos caras aos seus pés, nenhum deles te causava um arrepio na
espinha ou um frio na barriga. Mesmo eu sendo o cara mais completo que
você já conheceu, nunca enxerguei nenhuma dessas qualidades em mim.
Lembro do dia que eu estava em um jantar com os familiares — Quase todos
da família estavam lá — E o celular tocou. Era você. Achei estranho,
pois você havia me dito mais cedo que iria sair com um carinha que
conheceu e estava ansiosa pra isso. Quando atendi, sua voz era de choro.
E você parecia estar histérica. Normalmente, teria dito para que
esperasse eu chegar em casa que te ligaria de volta. Mas quase que
imediatamente, levantei da mesa e fui para fora. Você dizia o quanto o
encontro foi ótimo, mas, você não tinha sentido nada de diferente, outra
vez. E isso te enlouquecia. Isso te tirava do sério. Aquele medo de
nunca gostar de ninguém, nunca sentir nada de diferente por alguém. E eu
fiquei ali, conversando com você, acalmando o seu choro, acalmando o
seu desespero. Eu fiquei ali o tempo que fosse preciso, e ficaria de
novo, de novo e de novo. Naquele momento, a única coisa que me importava
era te ouvir rir novamente, mesmo a sua risada sendo a mais estranha
que já escutei, era a que eu mais queria ouvir. E eu consegui. Com
piadas e o meu jeito idiota. E você ficou calma, você ficou tão serena.
Ao fim da conversa, você respirou fundo e disse com a voz mais doce do
mundo: Eu te amo — E desligou. Foi a primeira vez que você tinha dito
isso, mesmo eu brincando que você me amava, mesmo eu dizendo que queria
ouvir — Você nunca tinha dito — Até aquele dia, até aquele instante. E a
última coisa que lembro, foi ter voltado para a mesa com o sorriso mais
sincero e contagiante do mundo. Você sempre se irritou pela minha falta
de confiança, e pelas vezes que voltei correndo pras minhas
ex-namoradas. Você dizia que eu só escolhia as garotas erradas e que
tinha medo de não conseguir alguém melhor, por isso vivia voltando para
elas. Você nunca se irritou, ou desligou o telefone, as vezes que te
liguei chorando porque tinha brigado com a namorada. Você apenas ficava
ali, escutando, ouvindo — Mesmo eu sabendo que você odiava aquilo e que a
sua vontade era matar a pessoa que me fez chorar — E mesmo assim, eu te
ligava. Era o primeiro número que pensava, não conseguia pensar em
ninguém melhor, que seria capaz de fazer uma piada cretina no momento em
que eu menos espero. E eu nunca me importei às vezes em que você ia
para a farra, se embebedava e me ligava chorando e dizendo que me amava.
Eu apenas dizia para você parar de beber e pedia para alguma amiga te
levar para casa, na verdade, eu dizia para elas cuidarem de você, porque
era o que eu faria, normalmente. Nunca me importou que você contasse
dos caras que saia, ou como eles eram bonitos, nem mesmo quando você
tirava o sarro por eu ser mais baixo que eles. Eu apenas ria e dizia que
não importava, porque no fundo, você sabia que nenhum deles era eu.
Você nunca gostou do silêncio que brotava em muitas das nossas
conversas, e dizia para eu dizer qualquer coisa que fosse, tudo era
válido — Menos o silêncio — E eu dizia que gostava de dar um silêncio em
certos momentos, porque é no silêncio de algumas conversas que a gente
escuta mais do que deveria escutar. E isso te incomodava, sempre
incomodou. Essa minha facilidade em saber tudo sobre você, mesmo você
não dizendo nada para mim. Eu sempre fui a pessoa que mais soube sobre
você, principalmente as coisas que você não dizia. E você sempre foi a
pessoa que mais soube dar valor à mim, mesmo eu nunca dando. E nós
sempre fomos os amigos mais completos do mundo, mesmo sendo tão
diferentes. Você sempre esteve lá. Sempre esteve cuidando de mim. Quando
todos viravam as costas, você dava o seu abraço. Quando todos me
esnobavam, você dizia que eu era a pessoa mais perfeita que você já
conheceu. Quando todos diziam que eu não era capaz, você estava lá para
lembrar tudo o que conquistei até o momento. E mesmo assim, nunca tinha
visto o que você realmente significava para mim, nunca tinha tentado ser
o cara certo para você, nunca tinha tentado um “Nós.”. Nunca tinha
visto nada disso, porque você sempre esteve comigo, você sempre esteve
do meu lado, você sempre se importou. E eu não vi. Não percebi que era
você o tempo todo. Sempre foi. Mas você se afastou, eu me afastei, nós
nos afastamos um do outro. E eu só fui perceber, porque você não estava
mais aqui para mim. E eu só fui ter a certeza, semana passada, quando te
vi de mãos dadas com o seu novo namorado. Não era mais um dos caras que
você saia por um dia, e isso mexeu comigo. Mexeu de uma forma que eu só
queria ir lá e te agarrar pelo braço, te trazer para perto, te trazer
para a minha vida. Mas eu não fiz isso. Porque você estava feliz. E é
isso que importa. Foi a sua felicidade que eu queria desde o primeiro
momento, e é ela que eu sempre vou querer. Mesmo que de longe, mesmo que
eu não seja o motivo da sua alegria, mesmo que você nunca saiba de
nada. É isso que importa. E hoje, sei que o amor é cego — Mas a gente é burro. Allax Garcia
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