Procura-se um amigo. Não precisa ser homem, basta ser humano, basta
ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar,
sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de madrugada, de
pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa.
Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não
ter esse amor… Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes
levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar. Não é preciso que
seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão.
Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é
preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser
vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não
ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter ressonâncias
humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena
das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve
gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer. Procura-se um
amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando chamado de
amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes
chuvas e das recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se
enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia,
dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. Deve gostar de
ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de
estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim. Precisa-se de
um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas
porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de
chorar. Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias
perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos
chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive. Carlos Drummond de Andrade
Nenhum comentário:
Postar um comentário